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11.11.06

A MÚSICA GÓTICA


Dentre os ilustres filhos que o punk rock concebeu, um dos mais pungentes e interessantes é o gótico. Nascido pouco após o boom punk que sacudiu a Europa, veio da Alemanha os primeiros ruídos do estilo, fruto de uma incursão também pelo chamado new romantic. O som feito por estas bandas, apesar de terem elementos dos new romantics ingleses, era um pouco mais sombrio, por isso estes grupos acabaram ganhando o rótulo de darks.
Seu visual era, e ainda é, muito parecido com o que se convencionou chamar de tribo urbana dos góticos. O uso do preto era predominante, com o uso de sobretudos e botas. A palidez de seus integrantes era ainda mais acentuada, graças ao uso de uma maquiagem carregada.
Letras recheadas de melancolia e pessimismo, junto com timbres de teclados soturnos era a característica marcante do jeito alemão pós-punk.
Este estilo tornou-se quase uma convenção, a que se atribuiu o rótulo gótico por uma aproximação latente à arquitetura gótica, com anjos e demônios, de referência à adeidade (falta de deus, fé) dos elementos, fruto direto do termo medieval.
O encontro com a literatura, em especial do movimento Romântico, também é uma característica marcante, além da moda, que é um elemento crucial do estilo, que desde seu início foi e é ligado mais à estética do que propriamente a uma filosofia.
Melancolia, morbidez e seus frutos diretos não é exclusividade gótica, ainda mais quando se leva em consideração a música propriamente dita.Voltando um pouco mais no tempo, vemos que esse som mais down, já era algo razoavelmente presente na música alemã. Desde a década de 60, grupos já se mostravam mais depressivos que seus congêneres ingleses, que viviam a ascensão dos Beatles e de um rock, digamos, mais alegre. Com a chegada dos new romantics, esse som mais depressivo começou a ser absorvido pelos jovens ingleses, os verdadeiros responsáveis pela ´explosão´ do gênero. Alguns grupos, sabidamente pós-punks, Joy Division por exemplo, foram lançados no caldeirão gótico. O Joy Division, inclusive, é considerado o "pai" do estilo.
Era o final da década de 70 e logo no limiar dos anos oitenta, o gênero iria viver seu apogeu. O estouro do estilo rolou no meio dos anos 80, quando grupos como Sisters of Mercy, Southern Death Cult (que depois viria a ser o Cult), Bauhaus, Cure (apesar de soar bem punk no começo da carreira), Siouxsie, Mission, Clan of Xymox, Christian Death e Fields of the Nephilim, entre muitos outros. Enquanto Cure e Siouxie, por exemplo, apostavam mais na mistura com o pop, Christian Death e Fields flertavam com o metal para assegurar sua sonoridade. Além deles, outra parte destas bandas, ainda nos 80, já flertava com outros tipos de som, como a música eletrônica, medieval e a world music, caso específico dos australianos do Dead Can Dance.
Este excesso de mistura decretou o fim do gótico no final da década, mas foi o caldeirão efervescente que fez surgir, na década seguinte, diversos filhotes, que receberam espertamente rótulos bacanas da indústria fonográfica, como coldwave, darkwave, ethereal, goth-metal e por aí vai. Esta incursão mais a fundo no estilo, mesclando vocais líricos, letras carregadas de misticismo e guitarras cada vez mais pesadas dão frutos até nas rádios rock brasileiras, vide o caso dos norte-americanos do Evanescence, mutação direta de bandas como o Nightwish, que é, talvez, uma das principais bandas que explodiram na década de 90. Até mesmo o caso de Marilyn Manson, o mais pop e polêmico caso do rock gótico, que sabe usar a mídia a seu favor como ninguém antes havia tentando. Durante boa parte dos anos 80, os góticos, até então chamados de darks, ainda mantinham uma certa ligação com o movimento punk, mas aos poucos os dois grupos foram se distanciando e hoje é muito difícil perceber algum tipo de ligação. De uma forma preconceituosa, os punks são tachados de burros e cabeça duras. Já os góticos passaram a se interessar por artes plásticas, literatura e cinema, o que deu ao movimento uma aura intelectual, mesmo que muitos dos que se chamavam góticos, apenas, pateticamente, arranhassem os conhecimentos nestas áreas. Mesmo assim é possível afirmar que a juventude gótica tem, de fato, mais interesse por áreas onde o resto dos jovens só entra se for obrigado.
Outra questão ´polêmica´ é a relação entre darks e góticos. Para muita gente o termo dark era algo criado pelos brasileiros, e que ganhou o país depois do Reginaldo, personagem de uma novela global, transformou os darks em motivo de piada nacional. Para outros o nome dark realmente existiu, como vimos, vindo das bandas alemãs e chegando ao resto da Europa. Independentes disso, alguns elementos são intrínsecos aos seguidores do estilo: o gosto pela melancolia, romantismo, depressão e uma certa rebeldia sonora.
Assim como vários outros estilos musicais, a década de 90 foi prolixa para o gótico e a fragmentação musical foi apenas uma conseqüência direta da maneira que a indústria musical concebeu para facilitar a vendagem e atingir o público certo, com menos trabalho. É aí que surgem várias confusões. Bandas como o Depeche Mode, muito ligada ao tecno-pop, acaba sendo ensacada no mesmo balaio gótico, ainda que em algumas canções, os elementos estruturais ligados à melancolia estejam presentes. Mas, musicalmente, é um erro crasso fazer tal afirmação.
Mas vamos às vertentes da música gótica:
Rock Gótico: Poderia ser chamado de gótico clássico, já que é representado pela primeira geração de bandas ligadas ao estilo. Sisters of Mercy, Mission, Ghost Dance. Em prática, acabou-se no final da década de 80, sendo ressuscitado, vez ou outra, por alguma banda clone.
Pop Gótico: Polêmico, mas esta denominação existe em vários sites, brasileiros e estrangeiros, que tratam do assunto. São bandas que mesclam sons mais pra baixo com momentos extremamente alegres. O Cure é citado como uma das bandas pop.
Gótico Eletrônico: No meu tempo era chamado de rock industrial, e não tinha ligação alguma com o gótico. Algo como Ministry, Nine Inch Nails, Front Line Assembly, Laibach e até o Front 242, seguindo o raciocínio dos góticos, entrariam no balaio.
Ethereal / DarkWave: Outro subgênero que, na falta de algum rótulo melhor, acabou sendo englobado pelos góticos. Bandas como Cocteau Twins, Dead Can Dance e até grupos ligados a new age, podem ser encaixados aqui. São bandas com arranjos mais leves, com letras surreais e vocais etéreos, às vezes flertando com a música clássica.
Metal Gótico: Este é o subgênero que mais cresce ultimamente, com as rádios colocando algumas bandas em suas programações. Como o próprio nome diz, mescla as guitarras pesadas do metal com arranjos soturnos, muitas vezes misturando vocais angelicais com outros guturais. Bandas como Tristania e Lacrimosa são alguns nomes que podemos destacar. Aqui também poderiam entrar alguns grupos, conhecidos como Doom Metal, que também brincam com a temática gótica e guitarras pesadas, mas, no nosso entender, são mais ligados ao thrash metal.
E no Brasil? Pra variar, assim como em vários outros estilos, os brasileiros fazem uma salada gigantesca ao incluir grupos como Zero, Uns e Outros e Violeta de Outono como bandas góticas. Os dois primeiros fazem pop/rock e o último trabalha com rock progressivo. De fato, algumas boas bandas se destacam no cenário alternativo, como a finada Der Kalte Stern, entretanto nenhuma delas conseguiu extrapolar o gueto da tribo urbana, sendo restritas apenas às pessoas que acompanham mais de perto.
Na ânsia de criarem uma cena gótica brasileira, algumas pessoas tentam ligar a MPB ao estilo, na verdade, tentando encontrar elementos góticos em músicas que em nada podem ser ligadas à cena. Não é por tratar de assuntos depressivos ou soturnos, que determinado artista possa ser enquadrado no estilo. O gótico musical brasileiro ainda carece, e muito, de uma referência nacional, tanto em letras quanto em sonoridade. Porque se fosse só melancolia, então estaríamos repletos de exemplos soltos por aí, que, de fato, nunca poderiam se incluídos na estética gótica.

(Por Valdir Antonelli e Danilo Corci)
"EXTRAÍDO NA INTEGRA DO SITE: http://www.dropmusic.com.br/"

SYNTH POP



Pegue o Glam Rock, especialmente David Bowie. Misture, na seqüência, o estilo do Roxy Music. Para temperar, use o Kraftwerk como referência. O que se obtém no final? Sim, o synth pop, estilo que surgiu no finalzinho da década de 70, início dos 80, e se ramificou por várias áreas da música. O Synth Pop, como gênero, é aplicado à New Wave, porém as especificações do synth pop são um pouco separadas demais para incluir no estilo que mais tarde consagrou o B`52s, por exemplo.

Soft Cell, A Flock of Seagulls, Eurythmics, Human League, Depeche Mode, Gary Numan, Devo, Duran Duran e porque não, um pouco de New Order também – mas bem pouco, ok?. Estas bandas podem ser citadas como talvez as mais influentes do gênero, mesmo que mais tarde a carreira delas tenham tomado rumos um pouco mais alternativos ao synth. Mas vamos ao que interessa, a princípio. O que faz o synth pop ser tão bacana? Em parte já explicado logo na abertura deste texto, a influência de David Bowie e Roxy Music são cruciais. Mas o grande filão da história é mesmo o Kraftwerk, o pai da música eletrônica.

Neste contexto é que as bandas puderam ousar, transformar o que ouviam quando ainda moleques e modelar à nova atitude que o grupo alemão legou. Sons, barulhos, bateria eletrônica, muito, muito sintetizador, repetições, efeitos. Esta era a tônica do synth pop originalíssimo. Tudo isto misturado com algo que poderia ser tocado nas pistas de dança, que então era inundada pela disco norte-americana. Portanto, é óbvio, o synth pop foi uma reação européia ao dance do Tio Sam.

O disco que moldou este gênero chama-se "Some Bizzare Compilation" de 1981, sendo inclusive o álbum que consolidou o surgimento de uma das mais interessantes gravadoras do mundo, a Mute. Grupos como Depeche Mode, The The e Soft Cell apareceram e conquistaram legiões de fãs. Porém, das inúmeras bandas que estavam ali usando seus teclados para canções de três minutos recheado de pop, muitas se resumiram em apenas uma canção de relativo sucesso. Foram descartados rapidamente, como exige a moda. Outros tantos resolveram mudar um pouco o enfoque para sobreviver, caso do Duran Duran que voou rapidinho para a outra vertente, a do New Romantics.

Mesmo que 1984 tenha sido o ano oficialmente da "morte" do synth pop, hinos foram legados: Tainted Love (Soft Cell), I Ran (A Flock of Seagulls), Don`t You Want me (Human League), Just Can`t Get Enough (Depeche Mode), Sweet Dreams (Eurythmics), Cars (Gary Numan), entre tantas outras, que seria realmente muito fácil listar.

E por que o synth pop é bom? Primeiro, a maneira que foi introduzido os teclados à música, com total soberania sobre os demais instrumentos. Se o punk rock, um pouco antes, havia destruído o conceito de elaboração musical, o synth dava a opção completa aos músicos dispensarem as cordas e a bateria acústica. Inclusive, apenas uma pessoa poderia ser a banda. O aparelho em questão, os keyboards, eram relativamente baratos na Inglaterra, coisa que ajudou a proliferar o surgimento de bandas. Mais. O synth pop, apesar de tudo, popularizou o homossexualismo, como um dos temas nas letras e até no estilo.

Neste aspecto, o que se deve levar em consideração é que quase todas as bandas eram compostas exclusivamente por gays. O Depeche Mode, por exemplo, tem uma canção desta época onde cantam que "garotos encontram garotos e ficam juntos". E não fica nisto. Todos, absolutamente todos, tinha visuais bizarros, mistura de transformismo, com um gosto duvidoso, saias prateadas, maquiagem carregada. Tudo o que, futuramente, foi parte integrante da moda na década de 80, que causou frisson entre os jovens da época, inclusive com muito das bandas adotando ou sendo adotadas por estilistas.

O Synth Pop, original, durou pouco, pouco menos do que cinco anos. Mas seu surgimento foi o responsável pelo boom pop que surgiu na seqüência, ou então pelas inúmeras bandas que até hoje fazem sucesso. Boa parte delas fugiram da maneira de se criar com teclados. Deixaram um pouco o estilo cru, que dava aquela intenção de punk, para adotar mais elaboração. Hoje, inclusive, o Depeche Mode se rendeu às guitarras e à bateria. Mas não importa. Foram também um dos mentores deste estilo musical, que vários grupelhos da atualidade - Ladytron, incluso por sinal - tentam copiar sem a mesma criatividade mas que ao menos recolocaram este gênero como uma opção inteligente para a música eletrônica.

(Por Danilo Corci)

"EXTRAIDO NA INTEGRA DO SITE: http://www.dropmusic.com.br/"

Bruxas: figuras de poder


Bruxas: figuras de poder

Witches: figures of power


Paola Basso Menna Barreto Gomes Zordan
Universidade Federal do Rio Grande do Sul


RESUMO

As mulheres que tanto a história como a imaginação popular mitificaram como "bruxas" constituem figuras que expurgam as fobias da Contra Reforma. As bruxas foram torturadas e queimadas para sinalizar os perigos de práticas e saberes à margem da Igreja e de outras instituições dominantes na Idade Moderna. Parteiras, curandeiras e carpideiras, as bruxas misturam em seu caldeirão os mistérios da vida e da morte herdados das tradições pagãs. Este artigo percorre textos de historiadores, em especial o de Jules Michelet, que no século XIX construiu a imagem romântica e martirizada da bruxa, e o manual de inquisidores do século XIV, o Malleus Maleficarum, que descreve os poderes da bruxa, sua aliança com o demônio e sua ameaça para o cristianismo. Os discursos instaurados por tais textos constroem tanto a imagem que glorifica a bruxa quanto aquela que a execra, mostrando ambas o potencial transformador de suas práticas e de sua ligação com a sexualidade.
Palavras-chave: bruxas, corpo, feitiçaria, paganismo, Inquisição.

ABSTRACT

The women whom history and popular imagination mythicized as "witches" constitute figures that purge the phobias of the Counter Reformation. Witches were tortured and burned to signal the dangers of practices and knowledge in the margins of the Church and other dominant institutions in the Modern Age. Midwives, healers and weepers, the witches blend in their large kettle the mysteries of life and death inherited from pagan traditions. This paper examines some historians' texts, especially that of Jules Michelet, who created the witch's romantic and martyred image, and the inquisitors' manual Malleus Maleficarum, that describes the witch's powers, her alliance with the demon and her threat to Christianity. These texts establish, through their different discourses, two opposing images: one that glorifies witches and another that execrates them, in order to show the transforming potential of their practices and their connection with sexuality.
Key Words: witches, the body, sorcery, paganism, the Inquisition.



Fêmea inebriante ou velha decrépita, a figura da bruxa exprime alguns conceitos que o pensamento ocidental legou ao que se entende por feminino. Trata-se de uma imagem construída por diferentes discursos, um romântico, propagado ao longo do século XIX, e outro eclesiástico, expresso nos enunciados seculares da cristandade contra arcaicas práticas pagãs. A fim de mostrar a constituição dessa imagem, o presente ensaio se pauta, entre tantas leituras, no manual de inquisidores, datado do século XIV, chamado Malleus Maleficarum,1 o "Martelo das Feiticeiras", e no livro La Sorcière (A Feiticeira), do historiador Jules Michelet. Enquanto o Malleus Maleficarum descreve a bruxa coadunada com o Mal (colocado na figura do demônio) e a execra, o romantismo de Michelet a transforma em mártir, enaltecendo suas qualidades silvestres e sua ligação com os gênios da natureza. Ambos os discursos permitem vislumbrar as paisagens paradoxais sobre as quais a imagem da mulher independente, dona de seu corpo e de seu destino, se cria.

Ambígua, a bruxa pode ser tanto a bela jovem sedutora (ainda sem marido e cheia de pretendentes) como a horrenda anciã (viúva solitária), aparentada com a morte. Como um tipo psicossocial que emerge no final da Idade Média, essa imagem abarca uma ampla gama de traçados históricos sobre as mulheres e as várias etapas de suas vidas: infância, menarca, juventude, defloramento, gravidez, parto, maternidade, menopausa, envelhecimento e morte. O que a figura da bruxa ensina é um certo modo de enxergar a mulher, principalmente quando esta expressa poder. Ao longo de muitas eras da civilização patriarcal, a lição predominante sobre as mulheres que fazem uso de poderes ou que se aliam a forças que, de um modo ou de outro, a máquina civilizatória não consegue domar é bem conhecida de todos. Toda expressão de poder por parte de mulheres desembocava em punição. Cunhada dentro do cristianismo, a figura das bruxas traduzia-se em mulheres devoradoras e perversas que matavam recém-nascidos, comiam carne humana, participavam de orgias, transformavam-se em animais, tinham relações íntimas com demônios e entregavam sua alma para o diabo. Uma análise da farta literatura sobre o assunto nos mostra que a caracterização da bruxa que vigorou durante a Inquisição, ressoando até os dias de hoje, constitui-se como um dos elementos mais perversos produzidos na sociedade patriarcal do Ocidente.

Certo tipo de conhecimento de origem camponesa, com suas práticas e crenças que delineavam modos de tratar doenças e lidar com as situações-limite da existência (nascimento, acasalamento, geração, morte), é tido como criminoso dentro do contexto histórico da Contra Reforma. Atribuíam-lhe tantas coisas ruins que o Malleus Maleficarum afirma que "seus atos são mais malignos que os de quaisquer outros malfeitores".2 Rompendo leis que certamente ignoravam, as bruxas encarnam tudo o que é rebelde, indomável e instintivo nas mulheres. Tudo aquilo que, nesse tipo de sociedade, demanda severas punições para que o feminino 'selvagem' se dobre ao masculino 'civilizado'.

Como personagem de imaginários em que as fronteiras entre real e ficcional estão densamente dissolvidas, a típica malvada dos contos de fadas e de várias histórias infantis traz muitos elementos da figura da bruxa descrita pela Inquisição. Histórica, a bruxa modifica-se dentro das eras, ficando em sua imagem as marcas que a sociedade lhe impôs. Marcas expostas em praças públicas através do espetáculo de seus suplícios e da execução das sentenças mortais que lhe eram imputadas. Pagando por crimes tais como dançar nua sob o luar, a bruxa é marcada pelo despudor e pela degeneração do corpo. Mulheres incômodas para a comunidade, viúvas solitárias ou vizinhas indiscretas, as bruxas eram aquelas cujas práticas eram consideradas crimes mais graves do que as heresias. Sedenta por poder, a bruxa é maléfica e corruptora, de modo que, tanto na realidade como na ficção, todas as histórias de bruxas terminam com o castigo por sua insubmissão: forca, fogueira, solidão.

No léxico catequizante das eras que antecedem ao contemporâneo, a bruxa era o expurgo de todos os males atribuídos ao feminino, começando com o pecado original e a desobediência da "primeira mulher", pintada como colaboradora de Satã. Protagonista de inúmeras condenações, a bruxa serviu como função pedagógica de cunho moralizador durante os séculos em que a Igreja focou a doutrina cristã no combate ao mal, inimigo personificado como o demônio, o adversário de Deus, Satanás. Vinculada à natureza, a bruxa estava ligada ao chamado "Príncipe do Mundo", o diabo, que, mesmo aparecendo hermafrodita em algumas representações, é uma entidade explicitamente fálica, masculina. A mulher não pode disputar o poder do universo nem mesmo quando se trata de ser adversária da divindade masculina central. Na lógica patriarcal, o poder da bruxa advinha de sua convivência com os demônios e do seu pacto com o diabo. Era inconcebível imaginar que a mulher, por si própria, tivesse a capacidade de curar e lançar malefícios sobre o corpo ou realizar certos fenômenos ditos "sobrenaturais". No Malleus Maleficarum fica claro que, se alguma bruxa operou algum prodígio sem a ajuda do diabo, certamente foi porque serviu como instrumento para que Deus realizasse alguma das obras necessárias para o aperfeiçoamento do 'plano divino'. Como subordinado de Deus, o diabo servia-se da bruxa para testar a fé dos homens e também de mulheres virtuosas. Mesmo as damas de 'boa conduta' eram suscetíveis aos cortejos infernais porque as mulheres eram mais 'facilmente seduzidas pelo pecado'.

Por pecado, subentenda-se a luxúria, o desejo sexual "disseminador do pecado original".3 A sexualidade, instância diabólica, era vista como "besta imunda" pelos eclesiásticos autores do Malleus. Todas as artimanhas atribuídas às bruxas, sortilégios, encantamentos, adivinhações, práticas de sedução, vôos noturnos, desembocam no ato carnal da junção de corpos e sexos ou na geração que lhe é conseguinte. Sucumbir aos desejos da matéria era tido como perdição para o espírito. Toda corrupção era oriunda do ato venéreo e as impossibilidades em praticar o ato carnal, conceber ou abortar após ter concebido eram consideradas bruxaria.4 Com o auxílio dos demônios, as bruxas tinham o poder, direto ou indireto, de impedir a aproximação dos corpos de homens e mulheres, pois "Deus outorga ao diabo poderes muito maiores sobre o ato venéreo".5
Copuladora, a bruxa é a mulher perversa que "ardentemente tenta saciar sua lascívia obscena", aquela cuja cobiça carnal é causa de infidelidade e cujo "fascínio desmedido" pela concupiscência faz dela alegoria da ambição e da luxúria.6 Mulher fatal, mortífera, causa de perdição, a bruxa advém das antigas deusas, da Lilith hebraica, dos ritos dionisíacos e dos bacanais. Aparece no Apocalipse como a grande meretriz "com a qual se contaminaram os reis da terra e que inebriou os habitantes da terra com o vinho de sua luxúria" (Ap 17,2), a toda adornada prostituta da Babilônia montada em uma fera escarlate, aquela que "se assenta sobre muitas águas" (Ap 17,1), cujo destino o profeta anuncia: vão despojar seus adornos, desnudar seu corpo, comer suas carnes e queimá-la no fogo. Torturadas, todas as acusadas de bruxaria confessavam terem mantido relações sexuais com o demônio.

O Malleus Maleficarum explica que a "natureza" dessas relações não era necessariamente carnal, visto que os demônios eram espíritos e que mesmo os corpos daquelas que estivessem aparentemente dormindo em sua cama, ao lado dos maridos, participavam dos sabás. Rituais de sexo e luxúria, os sabás eram tidos como odes a Satã, festas macabras nas quais se comia carne de recém-nascidos, entrava-se em transe e após danças frenéticas as bruxas copulavam com o diabo. Foram descritos como missas negras, nas quais os adeptos renegavam a fé cristã por meio do que a Inquisição supunha ser um arremedo das práticas católicas. Pierre Töpffer enfatiza a diferença entre a missa negra, de elementos alusivamente anti-cristãos, e o sabá, termo que aparece no final da Idade Média para aludir a festividades não-cristãs, nas quais práticas da velha religiosidade camponesa, com resquícios do paganismo, ainda vigoravam. O termo é oriundo dos sabat dos judeus, que também eram tidos como proscritos. Tanto em um como no outro ritual, o corpo ganha uma evidência bem maior do que na convencional missa cristã: os feiticeiros vão nus para o sabá e usam o corpo para dançar, comer e fazer sexo e, por sua vez, a maior parte das missas negras usam o corpo nu de mulheres, mais especificamente o ventre, como altar.

Mesmo com a finalidade de o fiel comungar 'comendo' e 'bebendo' do corpo e do sangue de Cristo, o que indica uma alusão muito forte ao paganismo, em particular aos cultos dionisíacos, a missa católica é um ritual asséptico onde ninguém come e bebe de verdade, não há saciedade para o corpo. De um modo totalmente teatral, os cultos cristãos explicitam a antropofagia das velhas religiões utilizando a simbólica do pão e do vinho, que surgem em minúsculas amostras. Todo estímulo aos sentidos, como sensações físicas, cheiros e sabores, é sutil, tal qual a música, e quase inexistente.7 Uma espécie de fusão sensorial com o divino é evocada na ritualística cristã tradicional, mas o corpo, com seus movimentos, volumes, expressões e odores, quase suprimido.
Os processos de bruxaria tinham um considerável enfoque nos corpos das bruxas: elas eram desnudadas à procura de um sinal que as pudesse recriminar. Procurando essa marca, "a marca da bruxa" e/ou a "marca do diabo", seus pêlos eram rapados e todo seu corpo examinado e perscrutado. Agulhas eram fincadas em sua carne a fim de se detectar um ponto diabólico insensível. A maior parte das confissões era obtida depois de muitas sessões nas quais eram lhes imputados flagelos. Em máquinas como "a donzela de ferro" e os "borzeguins", ou nas torturas sobre a água, no aquecimento dos pés e na introdução de ferros sob as unhas,8 a ré passava por tantos suplícios que acabava por admitir as sentenças elaboradas pelo inquisidor. "Com a tortura, pode-se fazer confessar tudo", comenta Jean Delumeau em sua História do medo no Ocidente.9 A fome e privação de sono às quais eram submetidos os acusados de feitiçaria também rompiam "qualquer resistência", 10 a ponto de admitirem todas as atrocidades que lhes eram atribuídas.

Na maior parte das vezes as bruxas eram condenadas à morte, mas não bastava enterrá-las, pois se acreditava que tinham a capacidade de emergir de dentro das sepulturas. Tal qual uma vampira, a prostituta da Babilônia aparece como "ébria de sangue dos santos e dos mártires de Jesus" (Ap 17,6), aquela cujo transe orgiástico e cuja presença no festim dos sentidos ameaçavam a doutrinação transcendental da Igreja. Por isso era necessário queimar seus corpos e lançar suas cinzas ao vento, para que, através das artes diabólicas, seu corpo não fosse capaz de se reconstituir. Há vários casos em que as filhas eram acusadas e queimadas tais quais suas mães, pois se acreditava que, desde muito cedo, além de serem oferecidas ao demônio, todas as filhas de bruxas eram iniciadas por suas mães nas artes da feitiçaria.

Não podemos dizer que as pobres acusadas dos séculos XV a XVII foram efetivamente uma ameaça para o clero vigente, mas a condenação de heresias que incentivou os processos contra bruxaria implicava a afirmação do poderio religioso, ideologicamente teocentrista, como resposta à redescoberta do humanismo greco-romano. Não há humanismo que não dialogue com o corpo, suas relações com o espaço, com as medidas e formas do homem, suas representações e sua exposição. O corpo jovem da estética clássica é valorizado como modelo de perfeição enquanto que os corpos mais grotescos e disformes abundam na iconografia do Inferno. Estreitamente ligada ao corpo (curandeira, camponesa, dona-de-casa, amante, prostituta, parteira), a bruxa é um dos agentes sociais escolhidos para expurgar os temores coletivos por meio do perecimento carnal.

Aquelas que "fizeram um tratado com a morte e um pacto com o inferno"11 traduzem o que o historiador Pierre Pierrard diagnostica como o medo presente no início da Idade Moderna: "a guerra endêmica, as epidemias, a atroz peste negra de 1348, a miséria, o banditismo dos caminheiros e a revolta dos pobres", que colocam o homem da época "em contato permanente com a morte. Às efígies suaves, sucedem-se, nos túmulos, anatomias arruinadas pela doença e a velhice, marcadas pela vida. As 'danças macabras' povoam os afrescos, as miniaturas e os poemas, misturando no mesmo desprezo papas, reis, lindas mulheres, clérigos e monges".12 Em sua História da Igreja,13 o autor comenta que a mentalidade animista, os encantamentos e os ritos de magia ocupavam considerável espaço no 'cristianismo' da população rural de modo que "a superstição mal se distingue da devoção"14, deixando espaço para todas as crenças que encontramos nos documentos relativos à caça às bruxas.

A crescente pobreza, que acompanha a extinção do feudalismo e o desenvolvimento dos centros urbanos, produziu histórias sobre bruxas que comem pessoas desenterradas e se alimentam de carne podre. Em sua pesquisa sobre missas negras, Pierre Töpffer assinala que "a miséria deve ter engendrado muitos excessos rapidamente identificados com práticas feiticeiras".15 Encontramos a freqüente imagem do caldeirão da bruxa e seu conteúdo repugnante, que se acreditava ser sopa de criancinhas assassinadas. No estudo de Fernando Del Oso, essas poções diabólicas são descritas como possuidoras de sabor hediondo, contendo ingredientes excêntricos, tais como asas de morcego, que estavam associados ao poder de voar.16 O conteúdo do caldeirão era servido nos encontros de bruxas ou usado nos preparativos para os festins. Acreditava-se que através dos ungüentos, com os quais cobriam o corpo para irem ao sabá, as bruxas podiam levantar vôo ou ir de uma cidade para outra em poucos instantes. Banhos, práticas de limpeza e medicina caseira também causavam suspeitas de bruxaria. Ao contrário do que os ocultistas denominam "alta magia" ou "magia branca", envolvida com alfabetos antigos, talismãs cabalísticos e hierarquias angélicas, a "negra" magia das bruxas constituiu-se na cozinha e sobre os demais afazeres domésticos do cotidiano das mulheres.

E é no contexto das inumeráveis tarefas do cotidiano feminino que a bruxa é descrita, no século XIX, como "mártir universal" pelo historiador Jules Michelet.17 Driblando as adversidades financeiras, a fome e o trabalho extenuante, a bruxa acabaria por deixar-se aliciar às forças malignas. Romântico, Michelet nos mostra a imagem da bruxa como exilada, morando sozinha em lugares ermos da natureza, exposta às intempéries, aos ventos fortes e às tempestades. Como uma ameaça à sociedade, muitas vezes expulsa de sua aldeia, a bruxa era isolada, uma fugitiva que, cedo ou tarde, seria procurada para servir como confessora de apaixonados e intermediar os mais diversos prodígios exigidos por aqueles que se arriscavam indo atrás de seus poderes.

Ao tratar das bruxas, Roberto Sicuteri refere-se ao arquétipo da mulher selvagem a partir da dificuldade do civilizado em conviver com a ferocidade feminina, sedimentando-se assim "a hostilidade para com os conflitos sexuais" e toda uma "aversão pelos instintos" que acompanham os preconceitos sobre mulheres independentes. Na mulher anterior a Eva (criada na semelhança e na igualdade com Adão), na mulher livre, fugitiva e "dona de si", os temores seriam projetados.18 Em sua História do medo no Ocidente, Jean Delumeau mostra a mulher como bode expiatório, sobre o qual "uns e outros exprimiam seu medo de subversão com a ajuda de um estereótipo há muito tempo constituído":19 a bruxa de olhar petrificante, mortal, enrijecedor. Personificação da atordoante falicidade do feminino, provocando ereções, causando impotência e até retirando ilusoriamente o membro viril, as bruxas manejam amplamente as partes mais íntimas dos corpos, transitando por tudo aquilo que se denomina "os terrores do coito". Cheia de raiva e agressividade, a mulher que detém o falo é a efígie castradora que ameaça o masculino, sendo comum que a misoginia inerente à figura da bruxa seja interpretada dentro do binômio falo/castração da tradição psicanalítica.

Mesmo nas velhas, a presença de todo um clamor desejante e de inevitáveis atribuições fálicas faz de todas as bruxas figuras sexualizáveis por excelência. Como fator- chave na diabolização da mulher, a sexualidade feminina20 apresenta-se sempre acompanhada de insaciedade, produzindo-se, assim, a imagem da bruxa voraz, a ogra devoradora que engole todos os seus filhos. Talvez como subproduto da miséria, sua fúria é o resultado de um imenso apetite impossível de ser satisfeito. Essa fome é intensificada no sexual e vem impressa no mito da avidez vaginal, sendo a boca da vulva considerada como a parte mais insaciável da mulher.21

Seus aspectos noturnos, funestos e lunares afastam-na das racionalidades. Parece difícil concebermos a bruxa como um personagem conceitual, pois seu devir não faz parte de uma filosofia, mas frui de sentimentos, percepções, intensidade pura de um corpo que sofre e goza. Sua existência histórica se deve à poesia clássica e ao direito canônico, literatura e retórica, fontes documentais que registram a bruxa como elemento lendário e ao mesmo tempo vívido para muitas sociedades. Seu tipo psicossocial está na fila das anormalidades, enquadrando-se na categoria dos monstros, próxima do animal, mas cheia de humanidade.22 Defeituosa, a bruxa não consegue ser descolada de seu corpo e de suas artes. Felix Guattari e Gilles Deleuze dizem que a arte é um modo de pensar através do percepto. Primeiramente, a bruxa é o que eles chamam de "figura estética", pura potência de "afetos que transbordam as afecções e percepções ordinárias".23

Senhora dos descontroles, a bruxa guarda, sob os panos, truques que servem para confundir, embaçar e atrapalhar a razão, fazer com que os cursos do pensamento sejam deslocados. No alvorecer das ciências psíquicas, as mulheres atordoadas pelo demônio, assim como toda sorte de "enfeitiçados", como, por exemplo, as religiosas do convento de Loudun, serão tidos como histéricos. A identificação da histeria, espécie de sujeição a uma "dupla mudança", com o feminino se deve ao fato de que o histérico, como aponta o psicanalista Philippe Julien, "procura confundir os hábitos de pensamento socialmente aceitos, perturbar os referenciais do saber universitário pondo à mostra seus limites, seus avatares e seus percalços".24 Os efeitos somáticos da histeria não se descolavam da sexualidade; era uma "desordem das paixões" com sua duplicidade "que não se deixa agarrar", uma patologia advinda do útero e se seus imensuráveis humores. Doença manifestada pelo corpo, a histeria é o sintoma do desejo de um desejo, expressão física da Falta, do amor pelo pai derrotado e diminuído, colocando para fora a própria castração através de gritos, uivos lancinantes de impotência, paralisações, dores, palpitações.

Com sua gargalhada estridente, pode-se dizer que a bruxa é personagem conceitual da psicanálise e das psicologias; a bruxa-histérica e suas disfunções da libido são os extremos da mascarada: choro e riso, mutismo e rumor, crueldade e compaixão – oscilações que configuram os humores femininos presos à matéria instável, sujeitos ao tempo e às mutações que o homem pouco controla. É uma figura que transita no pantanoso terreno do irracional, da carne e da animalidade. Andrógina, a bruxa é monstruosa porque traz consigo a mistura das espécies e a mistura de sexos diferentes. Mulher-árvore encarquilhada pelo tempo, mulher-loba correndo pela floresta nas noites de lua cheia, mulher e besta, a bela e a fera. A bruxa, como todos os monstros, é híbrida. Bissexual, a promiscuidade da bruxa mostrava o quanto era perversa e animalesca. Disfarçando seus pés com formas de garras, a bruxa engana fazendo com que todo seu hibridismo pareça ilusão, pois seu aspecto monstruoso esconde-se por baixo das saias.

O território da bruxa é como o deserto produtor de miragens, o mundo alucinatório dos transes, o discurso eterno e atordoante da confusão infernal, o limiar da loucura. Como solucionadora ou culpada dos problemas, sua figura faz parte de acontecimentos drásticos: o desespero de certos apaixonados, o acometimento de enfermidades, acirradas lutas pelo poder e outros abalos, como tempestades, a morte do gado ou o extravio de colheitas. As bruxas podem ser personagens conceituais, pois cumprem com o papel de "manifestar os territórios, desterritorializações e reterritorializações absolutas", porque marcam um modo de pensar cujos "traços personalísticos se juntam estreitamente aos traços diagramáticos"25 que constituem o plano de imanência. Este é o plano dos pensamentos, uma superfície na qual estão colocados os conceitos e suas incontáveis possibilidades de composição. A bruxa é aquela que se compõe junto a uma grande variedade de pré-conceitos pensados sobre o feminino, sobre o corpo, a natureza e os ciclos de nascimento, vida e morte.

As descrições do Malleus Maleficarum ajudaram a construir uma imagem fantástica sobre pessoas, na maior parte das vezes mulheres, capazes de se transformarem em animais, voarem, percorrerem grandes distâncias em segundos e manipularem os humores corporais. Todos esses prodígios eram ineficientes depois que as bruxas eram tomadas sob o jugo da Igreja, conseguindo, no máximo, ludibriar seus algozes por meio de palavras ou olhares diabólicos. Acreditar ou desacreditar nas incríveis proezas da bruxa não é servir-se de um certo encadeamento simbólico e de configurações imaginárias, que fazem com que seus traços passem ao ilusório campo das sublimações. Pensar sobre uma ótica psicanalítica é fazer da bruxa uma alegoria, típica projeção dos terrores da castração.

Tipo psicossocial ligado aos resquícios pagãos da Idade Moderna, a bruxa carregou em seu corpo os saberes não-racionais que a sociedade dessa época temia. Como figura estética, potência plena de afetos, a bruxa expressa o poder das grandes Deusas, a divinização da Natureza e a terra-corpo como sagrados. É um pensar que sente a matéria que nos engole, não mais sob a perspectiva egóica e neurótica, mas sim com a percepção esquizóide de que tudo faz parte dessa imensurável devoração. É um pensamento indistinto, demoníaco, arcaico e em devir. Como personagem conceitual para esse pensamento, diferente daquele instaurado pela História da Filosofia, a bruxa traz um conhecimento 'outro', marcado pela indistinção. Conhecer sua realidade, pele concreta das coisas marcada na passagem da vida, é extrair o ardente espectro de um corpo agonizante. Corpo pleno, que fulgura na singularidade da carne, além do organismo, estendido ao corpo da Terra e ao do céu que a circunda. Corpo-mundo engolidor.

Referências bibliográficas
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BORNAY, Erika. Las hijas de Lilith. Madrid: Cátedra, 1998.
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DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. O que é a filosofia? Rio de Janeiro: Ed. 34, 1992.
FOUCAULT, Michel. Os anormais. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
JULIEN. Philippe. "Histeria". In: KAUFMANN, Pierre. Dicionário Enciclopédico de Psicanálise: o legado de Freud e Lacan. Rio de janeiro: Jorge Zahar, 1996. p. 245-252.
KOLTUV, Bárbara Black. O livro de Lilith. São Paulo: Cultrix,1997.
SPRENGER, James; KRAMER, Heinrich. Malleus Maleficarum, o martelo das feiticeiras. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 1991.
MICHELET, Jules. A feiticeira. São Paulo: Círculo do Livro, 1989.
NOVINSKY, Anita. A Inquisição. São Paulo: Brasiliense, 1993.
OSO, Fernando Jiménez Del. Brujas, las amantes del diablo. Madrid: Anaya, 1995.
PIERRARD, Pierre. História da Igreja. São Paulo: Edições Paulinas, 1982.
SALLMAN, Jean Michel. As bruxas, as noivas de Satã. Rio de Janeiro: Objetiva, 2002.
SICUTERI, Roberto. Lilith: a Lua Negra. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985.
RUSSEL, Jeffrey Burton. A história da feitiçaria. Rio de Janeiro: Campus, 1991.
TÖPFFER, Pierre. As missas negras. Póvoa de Varzim: Publicações Europa-América, 1980.


[Recebido em outubro de 2004 e aceito para publicação em maio de 2005]


Copyright © by Revista Estudos Feministas 1 Escrito pelos inquisitores Heinrich Kramer e James Sprenger, foi incansavelmente consultado nos tribunais eclesiásticos dos séculos precedentes nos processos de bruxaria (SPRENGER e KRAMER, 1991). 2 SPRENGER e KREMER, 1991, p. 67. 3 SPRENGER e KREMER, 1991, p. 247. 4 SPRENGER e KREMER, 1991, p. 155. 5 SPRENGER e KREMER, 1991, p. 328. 6 SPRENGER e KREMER, 1991, p. 121. 7 Não incluo o sentido do olhar porque este é a percepção corpórea tradicionalmente legada ao espírito. As grandes catedrais, por exemplo, mostram que o olhar, sendo o olho um atributo da onipresença divina, era o sentido do qual a Igreja viria se ocupar. A abundância de imagens e motivos no catolicismo é tão grande que é sobre sua história que a História da Arte ocidental vai se constituir. 8 Jean Michel SALLMAN, p. 74. 9 DELUMEAU, 1989, p. 381. 10 DELUMEAU, 1989, p. 381. 11SPRENGER e KREMER, 1991, p. 172. 12 PIERRARD, 1982, p. 158. 13 Publicado por uma editora católica, o livro omite a sordidez e a crueldade da Inquisição, embora tenha passagens que se refiram à corrupção do clero e a autoridades eclesiásticas que viviam em concubinato. 14 PIERRARD, 1982, p. 164. 15 TÖPFFER, 1980, p. 43. 16 OSO, 1995, p. 162. 17 MICHELET, 1989, p. 240. 18 SICUTERI, 1985, p. 111. 19 DELUMEAU, 1989, p. 382. 20 DELUMEAU, 1989, p. 327. 21 SICUTERI, 1985, p. 114. 22 Sobre o misto inerente aos monstros, ver FOUCAULT, 2001, p. 79. 23 GUATTARI e DELEUZE, 1992, p. 87-88. 24 JULIEN, 1996, p. 246. 25 DELEUZE e GUATTARI, 1992, p. 92.

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